Advogada Andréia Ana Paula da Silva (OAB/SC 47.299)
Estagiária Jheannine de Souza –
O objetivo do presente artigo é abordar questões pertinentes à prescrição extintiva (bienal e quinquenal) frente à (im)possibilidade de acesso ao judiciário, nas relações de trabalho em que o contrato se encontre suspenso em virtude da percepção do auxílio doença ou da aposentadoria por invalidez.
Como prescrição entende-se a perda do prazo legal pelo titular de um direito de ação que deixa de exercê-lo, gerando a extinção do direito.
A Lei 10.406 de 2.002 que instituiu o Código Civil, prescreve em seu artigo 189: “Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os artigos 205 e 206”. (destacado)
No Direito do Trabalho, a prescrição é disciplinada pelo artigo 11 da CLT:
“Art. 11. A pretensão quanto a créditos resultantes das relações de trabalho prescreve em cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho.” (destacado)
No mesmo sentido encontra-se disposto na Constituição Federal, artigo 7°, inciso XXIX:
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XXIX – ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho;” (destacado)
A prescrição quinquenal refere-se à limitação imposta ao trabalhador para reivindicação de créditos resultantes de relação de trabalho, cinco anos (retroativos), contados da data do ajuizamento da ação trabalhista.
A prescrição bienal diz respeito ao prazo limite de exercício pelo empregado para levar sua pretensão a apreciação do judiciário, podendo assim, reaver os direitos resultantes da relação de emprego.
Ou seja, extinto o contrato de trabalho, o trabalhador contará com dois anos para demandar seus direitos na justiça especializada, podendo reclamar os direitos trabalhistas dos últimos cinco anos, retroativamente, da data do ajuizamento da reclamação.
Assim, é o que traz o Enunciado 308 da Súmula TST:
“Súmula n° 308 do TST – PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL (incorporada a Orientação Jurisprudencial nº 204 da SBDI-1) – Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005
- Respeitado o biênio subseqüente à cessação contratual, a prescrição da ação trabalhista concerne às pretensões imediatamente anteriores a cinco anos, contados da data do ajuizamento da reclamação e, não, às anteriores ao qüinqüênio da data da extinção do contrato. (ex-OJ nº 204 da SBDI-1 – inserida em 08.11.2000)
- A norma constitucional que ampliou o prazo de prescrição da ação trabalhista para 5 (cinco) anos é de aplicação imediata e não atinge pretensões já alcançadas pela prescrição bienal quando da promulgação da CF/1988. (ex-Súmula nº 308 – Res. 6/1992, DJ 05.11.1992)”
Proposta a ação, está interrompida a prescrição. Porém, existem outras situações que podem acarretar a suspensão do prazo prescricional, como por exemplo, a absoluta impossibilidade de acesso ao judiciário, objeto do presente estudo.
A prescrição extintiva do direito frente à dificuldade de acesso ao judiciário, encontra fundamento no teor da Orientação Jurisprudencial 375 do TST, que expressa:
“OJ-SDI1-375 AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. PRESCRIÇÃO. CONTAGEM (DEJT divulgado em 19, 20 e 22.04.2010) A suspensão do contrato de trabalho, em virtude da percepção do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez, não impede a fluência da prescrição quinquenal, ressalvada a hipótese de absoluta impossibilidade de acesso ao Judiciário.” (destacado)
Ocorre a suspensão do contrato de trabalho quando se verifica a paralisação temporária da sua execução. Nos termos do artigo 75 do Decreto n. 3.048/99 e do Enunciado 282 da Súmula do TST, incumbe ao empregador o pagamento do salário referente aos primeiros quinze dias de afastamento do empregado em decorrência de acidente ou de doença. Assim, durante referido período, o contrato de trabalho estará interrompido.
A suspensão do contrato de trabalho a que se refere a OJ 375/TST, ocorre posteriormente ao décimo quinto dia da ocorrência do acidente de trabalho, diagnóstico da doença ocupacional ou patologia que gere a incapacidade do trabalhador.
Assim, sobrevindo necessidade de prolongamento do afastamento das atividades laborais, o empregado estará segurado pela Previdência Social, tendo o seu contrato de trabalho suspenso, nos termos do art. 471 e seguintes da CLT.
Há precedente do colendo Tribunal Superior do Trabalho, no sentido de que constatada a (IM)possibilidade de acesso ao judiciário resultante de doença ou acidente que ocasione a suspensão do contrato de trabalho, estará prejudicada a fluência da prescrição extintiva. Em não comprovada, não há o que falar em suspensão da prescrição.
“SUSPENSÃO. CONTRATO DE TRABALHO. PERCEPÇÃO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PRAZO PRESCRICIONAL. CONTAGEM. O afastamento do empregado em gozo de auxílio-doença não enseja a suspensão do prazo prescricional para o exercício da pretensão às verbas trabalhistas. Isso porque a suspensão do contrato de trabalho não acarreta, por consequência, a suspensão da prescrição, ante a inexistência de previsão legal, ressalvada a hipótese de absoluta impossibilidade de a parte ter acesso ao Judiciário, condição não reconhecida pela instância ordinária. Inteligência da Orientação Jurisprudencial nº 375 da SBDI-1. Recurso de revista conhecido e provido ” (RR-48200-83.2008.5.09.0195, 2ª Turma, Relator Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos, DEJT 05/08/2011).
“AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. SUSPENSÃO CONTRATO DE TRABALHO. PRESCRIÇÃO. PLANO DE SAÚDE. DECISÃO EM CONSONÂNCIA COM A ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL 375, SBDI-I, DESTA CORTE. NÃO PROVIMENTO. INCIDÊNCIA DO ARTIGO 896, § 5º, DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO. Não merece ser provido o Agravo de Instrumento quando a decisão impugnada está em consonância com a Orientação Jurisprudencial nº 375, da SBDI – desta Corte. Segundo o cenário fático cravado pelo Tribunal de origem, a parte autora foi descredenciada do plano de saúde em 30/11/2005 e o ajuizamento da presente demanda ocorreu em 27/03/2012. O fato de a reclamante estar incapacitada para o exercício de suas funções, ante a concessão da aposentadoria por invalidez, permanecendo a sua capacidade de locomoção e raciocínio, não lhe retira o poder de recorrer ao judiciário, a fim de dirimir qualquer controvérsia, e, desse modo, a suspensão legal a que fica submetido o contrato nesse interregno, não tem o condão de afastar a fruição do lapso prescricional que persiste íntegro. A sintonia demonstrada entre a decisão recorrida e a jurisprudência pacífica do Tribunal Superior do Trabalho, obsta o conhecimento do recurso de revista, nos termos do artigo 896, § 5º, da Consolidação das Leis do Trabalho em sua redação vigente à data da prolação da decisão. Agravo de Instrumento a que se nega provimento” (AIRR-434-08.2012.5.02.0383, 1ª Turma, Relatora Desembargadora Convocada Luíza Aparecida Oliveira Lomba, DEJT 17/04/2015). (destacado)
A limitação de acesso ao Judiciário não foi qualificada na OJ. Portanto, pode-se concluir que ela poderá ter razões desvinculadas da situação do empregado, ainda que igualmente passíveis de inviabilizar o acesso ao Poder Judiciário.
Contudo, a posição mais adequada, deverá manter características mais restritivas, nas quais se aplica subsidiariamente as normas do direito civil. Desta forma, a “absoluta impossibilidade” deve ser interpretada em consonância com o artigo 198, I, do Código Civil, dispositivo que impede a fluência do prazo prescricional contra absolutamente incapazes.
De modo a melhor elucidar a questão, cabe mencionar que no ano de 2017, ao analisar os autos do AIRR nº 384-74.2013.5.09.0084, a colenda Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou recurso de uma empresa do Paraná, contra decisão que reconheceu a absoluta impossibilidade de acesso ao Judiciário de uma vendedora afastada por depressão, que a impedia de sair de perto do filho por medo de que fosse sequestrado ou estuprado. Com isso, manteve-se o entendimento no sentido da suspensão da prescrição quinquenal.
REFERÊNCIAS:
ROMAR, Carla Teresa Martins. Direito do Trabalho. Coordenador Pedro Lenza. – 4. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2017.
ROSSAL, Francisco; COIMBRA, Rodrigo. A Prescrição e o Direito do Trabalho – De acordo com a Lei n. 13.467/17 – Reforma Trabalhista, CPC de 2015, LC. 150/2015 (empregado doméstico), e a decisão do STF no ARE-709212/DF sobre a prescrição do FGTS – São Paulo: Editora LTR, 2018.
TST, > https://jurisprudencia.tst.jus.br/ < AIRR-384-74.2013.5.09.0084